Por André Victória da Silva
Meu primeiro contato com Planejamento Estratégico se deu com a minha querida amiga e então Diretora da Academia Universidade de Serviços (hoje Académie Accor), Célia Ferraz, a quem tenho como uma das grandes referências desse tema. Depois, na sequência, foram as ricas experiências com o saudoso amigo Alexandre Mathias, que infelizmente teve sua vida abreviada, nos deixando uma grande lacuna no universo da Gestão Estratégica de Negócios.
Ao longo desse tempo, como gestor de negócio, participei das reflexões estratégicas da Academia Universidade de Serviços, dos Hotéis Sofitel na Costa do Sauípe, do Mercure Grand Hotel São Paulo Ibirapuera e do Sofitel Salvador. Como instrutor e utilizador do planejamento estratégico aplicado à formação de equipes de pré-abertura dos hotéis, fiz uso dessa prática na abertura dos hotéis Sofitel São Paulo, Grand Mercure São Paulo Ibirapuera, Mercure Jardins, Ibis Casa Verde, Ibis Curitiba Shopping e Ibis São José dos Campos. E como Consultor, consolidando meu aprendizado, coordenei os processos de planejamento estratégico da Operadora mineira Vert Hotéis (adquirida pela Atlântica Hotels em 2018) e do Novotel Itu.
Semana que vem retomo essa minha competência, quando coordenarei o planejamento estratégico da Hotéis Dom Rafael, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.
Enfim, isso tudo para dizer que essa é uma atividade que há muito está presente em minha trajetória profissional.
Por que estou falando isso aqui?
Porque quero compartilhar um aprendizado importante em relação ao Planejamento Estratégico e à Gestão Estratégica que lhe é inerente.
Trata-se das nossas limitações racionais e sua influência fundamental no processo de definição e operacionalização da estratégia de negócios.
Já há muito tempo, a limitação da nossa racionalidade é um tema bem explorado pelo economista alemão Herbert Alexander Simon, que deixou claro como trocamos a “Escolha Ótima” resultante do Modelo Racional, pela mera “Escolha Satisfatória”, do chamado Modelo Simplificado, que é o que de fato utilizamos. O que ocorre é que diante da enorme complexidade do processo de coleta e análise do total de alternativas possíveis para a tomada de qualquer decisão (e aqui no meu caso, o que mais interessa são as decisões de caráter estratégico de um negócio), seja por falta de acesso às informações completas, falta de tempo ou limitações cognitivas, nós trocamos o ótimo pelo “já está bom assim”.
Não precisa complicar demais a explicação para entender do que estou falando, basta lembrar da última compra que você fez. Seja lá do que for!
Você realmente buscou todas as alternativas possíveis antes de tomar a decisão?
Ou apenas optou por comprar onde se sentiu mais confortável para tomar a decisão?
E o curioso sobre isso é que ainda continuamos acreditando em nossa chamada racionalidade econômica plena.
Sinto dizer-lhe, mas ela não existe.
Não somos nada bons em tomar decisões econômicas no nosso dia a dia, tanto para comprar como para vender algo, e isso tem enormes implicações na gestão empresarial.
Há alguns anos conheci o trabalho do economista israelense-estadunidense Daniel Kahneman e aí tudo mudou para mim em relação ao processo de definição e gestão estratégica. Aliás, eu acho que poderia dizer que tudo mudou na minha vida, pois descobri os processos que limitam nossa racionalidade e consequentemente nossa tomada de decisões, e passei a me relacionar de forma diferente com a minha interação com a realidade.
Passei a operar cada vez menos com o Sistema 1 e a operar cada vez mais com o Sistema 2, para usar um conceito do autor.
Simplificadamente, o Sistema 1 é quando estamos operando nossa racionalidade no modo rápido, intuitivo, emocional, automático, inconsciente e associativo. Ele é usado para atividades do dia a dia, como fazer contas simples, escovar os dentes, tomar banho ou dirigir em um caminho conhecido até o trabalho, por exemplo. Já o Sistema 2 é mais lento, lógico, deliberativo, racional, dedutivo e estruturado. Ele é usado toda vez que nos deparamos com atividades mais complexas, como resolver uma equação matemática ou preencher um formulário.
A questão é que somos econômicos por natureza, ou seja, nós tendemos a “jogar” tudo para o Sistema 1, porque ele é menos exigente, menos custoso para nós e assim, mesmo diante de situações mais complexas, em que deveríamos usar o nosso Sistema 2, a gente usa o Sistema 1.
Nós acabamos por ser vítimas diárias de nossos vieses e heurísticas.
São situações do tipo: ficarmos ligados demais a um julgamento inicial, perdendo a sensibilidade para a informação nova e divergente, perseguirmos uma opção de ação cegamente, comprometendo-nos ainda mais se ela não produz os efeitos esperados, transpormos o entendimento de um caso simplificado conhecido a um outro caso complexo e desconhecido, vermos excessivas vantagens na solução que a gente prefere a priori e só inconvenientes nas outras soluções possíveis, generalizarmos abusivamente a partir de situações e experiências passadas, superestimarmos o nosso grau de controle sobre o curso dos acontecimentos e desprezarmos as soluções das quais temos a descrição apenas incompleta.
Todas essas situações minam completamente a nossa capacidade de refletir estrategicamente e, por conseguinte, analisar cenários, tomar decisões e definir estratégias de negócio adequadas.
Assim sendo, e aqui o aprendizado que queria compartilhar, não há como conduzir um processo de Planejamento e Gestão Estratégica sem no mínimo sensibilizar os decisores para essa limitação e a necessidade de estarem o máximo de tempo possível dedicados a esse tipo de trabalho, usando o seu Sistema 2.
O verdadeiro desafio de um bom estrategista de negócios é primeiramente aprender a usar o Sistema 2 com mais frequência. Essa é a pedra fundamental do planejamento e da gestão estratégica.